NATUREZA JURÍDICA DA PLR
A Constituição Federal, em seu art. 7º, XI, garantiu aos trabalhadores o direito à Participação nos Lucros ou Resultados (“PLR”), sendo verba desvinculada da remuneração e de natureza indenizatória, conforme definido em lei.
A PLR funciona como incentivo aos colaboradores, pois viabiliza o compartilhamento do sucesso financeiro da empresa. A companhia, por outro lado, pode aumentar a sua competitividade no mercado, atrair talentos e reduzir custos tributários, em razão da exclusão desses valores da base de cálculo das Contribuições Previdenciárias.
A não tributação está prevista nos art. 22, §2º, e art. 28, § 9º, “j”, ambos da Lei nº 8.212/91. Para que elas não integrem a base de cálculo das Contribuições, devem ser atendidos os requisitos da Lei nº 10.101/00. De acordo com essa norma, dentre outras exigências, a PLR deve ser negociada entre a empresa e seus empregados e arquivada em entidade sindical de trabalhadores, com metas e regras claras e objetivas, sendo vedado o pagamento de mais de duas parcelas de PLR no mesmo ano.
CONTROVÉRSIA EM RAZÃO DAS DIFERENÇAS ENTRE O DIRETOR EMPREGADO E O NÃO EMPREGADO
O problema surge quando o beneficiário da PLR é um diretor não empregado (estatutário). Para a Receita Federal (“RFB”), conforme Solução de Consulta COSIT nº 16/18, a expressão “trabalhadores”, que se refere aos beneficiários da PLR, deve ser compreendida como referência aos colaboradores com vínculo de emprego. Assim, na hipótese de os valores serem transferidos aos diretores estatutários, que possuem relação jurídica diversa, a exclusão da base de cálculo das Contribuições Previdenciárias não seria possível.
JURISPRUDÊNCIA DO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS (“CARF”)
As decisões do CARF sobre a matéria oscilaram nos últimos anos, conforme as alterações nas regras de desempate de julgamento.
Assim, os comentários abaixo sobre a jurisprudência desse tribunal serão divididos em 3 partes: (i) durante a vigência do voto de qualidade do presidente do órgão fracionário, representante do Fisco; (ii) após o fim do voto de qualidade, em razão da inserção do art. 19-E na Lei n° 10.522/2002 em 2020; e (iii) após o retorno do voto de qualidade, por meio da medida provisória n° 1.160/2023 e posteriormente pela Lei nº 14.689/23.
a) Jurisprudência do CARF durante a vigência do voto de qualidade (até abril de 2020)
Na vigência do voto de qualidade, a Câmara Superior de Recursos Fiscais – CSRF, órgão do CARF responsável por uniformizar sua jurisprudência, consolidou (acórdão nº 9202–008.198, de 2019) entendimento favorável à inclusão da PLR de diretores estatutários na base de cálculo das Contribuições Previdenciárias. Foi confirmada a interpretação restritiva da RFB e consignado que a PLR, atualmente regulada pela Lei nº 10.101/00, está limitada aos empregados da empresa.
b) Jurisprudência do CARF após o fim do voto de qualidade (de abril de 2020 a janeiro de 2023)
Em abril de 2020, o voto de qualidade foi substituído pelo desempate pró-contribuinte, nos termos do art. 19-E da Lei nº 10.522/02, com a reversão de entendimentos no CARF.
Precedentes da CSRF favoráveis aos contribuintes foram proferidos, a exemplo dos acórdãos nº 9202-010.354, de agosto de 2022, e 9202-010.512, de novembro de 2022. Nesses casos, prevaleceu a interpretação de que a Lei nº 10.101/00 também regulamenta a PLR de diretores estatutários, pois a norma apenas concretiza a previsão do art. 7º, XI, da Constituição, além de não realizar qualquer distinção entre os dirigentes.
c) Jurisprudência do CARF após retorno do voto de qualidade (de janeiro de 2023 a junho de 2023 e de setembro de 2023 em diante)
Em janeiro de 2023, o voto de qualidade foi restabelecido por meio da Medida Provisória nº 1.160/23. A Medida não foi convertida em lei e caducou em 1º de junho deste ano. Posteriormente, foi promulgada a Lei nº 14.689/23, em setembro de 2023, restabelecendo definitivamente o voto de qualidade.
Durante a vigência da referida Medida Provisória, a CSRF decidiu, no Acórdão nº 9202-010.622, de março de 2023, que o objetivo pretendido pelo art. 7º, XI, da Constituição, ao prever a PLR aos trabalhadores, foi o de tutelar os direitos dos colaboradores com vínculo de subordinação. Assim, não seria possível estender ao Diretor Estatutário idêntico tratamento tributário.
Mais recentemente, em outubro de 2023, nos autos do Processo Administrativo nº 13977.000165/2007-71 (acórdão ainda não publicado), a CSRF entendeu, à unanimidade, que a exclusão da PLR das Contribuições Previdenciárias só é possível quando pago a diretor que possui vínculo empregatício.
CASOS RECENTES ANALISADOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (“STJ”)
No âmbito judicial, a Primeira Turma do STJ, em julgamento realizado no dia 8/11/2023 (REsp 1.182.060/SC), adotou a interpretação defendida pela RFB. Para a Corte, o fato de o Diretor Estatutário não ter vínculo empregatício impede que as verbas transferidas a título de PLR sejam excluídas da base de cálculo das Contribuições Previdenciárias.
A Segunda Turma, por sua vez, em outubro deste ano (AgInt nos EDcl no REsp nº 1.873.583/SP), reconheceu que o pagamento de PLR a diretores estatutários foi regulado pela Lei nº 6.404/76, podendo ser excluído da base de cálculo das Contribuições Previdenciárias.
CONCLUSÃO
A PLR é uma verba indenizatória paga aos trabalhadores em razão do atendimento de determinadas metas previamente estabelecidas ou da existência de lucro líquido ao fim do exercício. Essa verba possui previsão no art. 7º, XI, da Constituição e, conforme artigos da Lei nº 8.212/91, não deve ser incluída na base de cálculo das Contribuições Previdenciárias, se observados os requisitos estabelecidos em lei específica.
Há controvérsia acerca da exclusão dessas rubricas da base de cálculo das Contribuições quando se trata de PLR de Diretor Estatutário, em razão de a RFB entender que a Lei nº 10.101/00 apenas regulamentou a PLR pago a Diretores Empregados.
Apesar de a tendência no âmbito administrativo ser de manutenção da cobrança da PLR de Diretores Estatutários, em razão da volta do voto de qualidade, o tema passou a ser enfrentado pelo STJ recentemente.
A Primeira Turma do Tribunal firmou entendimento desfavorável ao contribuinte, afirmando que apenas os diretores empregados podem ter sua PLR excluída da base de cálculo das contribuições. Por outro lado, a Segunda Turma possui precedente favorável à exclusão também dos pagamentos realizados aos diretores estatutários. O tema deverá ser novamente julgado pelo STJ, com a possibilidade de a Primeira Seção do STJ, que abrange ambas as Turmas, fixe a interpretação definitiva da legislação federal sobre a matéria.
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